Quarto capítulo do livro homônimo lançado em
2018
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ENCONTRO ESPECIAL
- Meu nome é Otaviano Neto do Nunes.
- Por que Neto no meio?
- Sei não. Tio João disse que é porque o
povo diz que sou neto do meu avô e ficou me chamando assim.
- Tu é bem grande, né?
- E você é baixinha! Ah! Ah!
- E por que você não procura uma mais alta
do que eu por aí pra conversar?
- Já viu mulher alta por aqui? É tudo
miudinha. Até os homens são miudinhos. Acho que fiquei tão grande de tanto
tomar leite da cabra cega.
- Leite da cabra cega?
- Isso. Mamãe morreu quando eu nasci e não
havia ninguém que me desse de mamar. Meu avô chamou o tio João e mandou que ele
comprasse uma cabra boa de leite só pra me alimentar.
- Eita....
- Mas tio João nem viu que a cabra era cega.
Na feira apenas mostraram como ela tava cheia de leite e só depois foi que ele
descobriu. Ficou furioso, mas quando lhe disseram que cabra cega tem leite de
engordar santo de altar-mor, ele se acalmou. Deu no que você tá vendo agora:
Eu! O homem grandão!
- Que negócio é esse de engordar santo de
altar-mor? Isso é sacrilégio!
- É uma maneira de falar. De dizer que leite
de cabra cega é bom e faz crescer. Ficou zangada?
- Não entendi bem, mas não vejo necessidade
de colocar santo nisso.
- Tá bem, tá bem. E você? Mora em que lugar?
Tá fazendo o que aqui na rua? Passeando? Qual é sua graça, hein?
- Meu nome é Madalena. Moro aqui em Calumbi.
- Aqui em Calumbi?! Também sou daqui e nunca
vi você por cá!
- Moro na igreja com meu pai.
- Que é isso, hein? Tá mangando de mim?
- Nada, nada. O padre Dica é o meu pai.
Conhece o padre Dicá?
- O padre Dicá é teu pai? Você tá mesmo mangando
de mim! Tá mangando!
- Nada, nada. Sou adotiva dele, visse? Mamãe
também morreu quando eu era pequena e ele tomou conta de mim até hoje.
Satisfeito? Tava pensando em quê?
- Tio João devia ter me contado isso. Eita! Filha
adotiva do padre? Eu nem sabia...
- Não saio muito de casa. Tomo conta da
igreja e ajeito ela para as missas, batizados, novenas... Por isso você nunca
me viu. Você não vai à igreja, vai? Nunca vi você na igreja!
- Bem... Isso... Sim... Não... É... Olhe,
parece que temos a mesma idade, hein? O padre Dicá... Foi ele que me batizou,
sabe? Era muito amigo do meu avô.
- Foi mesmo? Já pensou? E você gosta de
morar por aqui?
- Fazer o quê? A gente nasce e tem um ninho,
tem terra no meio e um pouco de história. Fazer o quê? Desgostar?
- Sei não... Eu sou louca pra sair daqui,
visse? É um sofrer danado. Muito de dor. Gente triste, sem água, terra seca pra
plantar. Acho que...
- Você não gosta...
- Não suporto. Queria sair daqui. Morar no
Recife. Ver o mar. Ver os rios de lá...
- Eu também quero conhecer, mas...
- Mas o quê?
- A gente tem que ir com alguma pessoa que
conheça o caminho, conheça a cidade.
- É...
- Sozinho a gente se perde. Tudo lá é muito
do grande.
- Deve ser, mas eu penso em sair daqui. Não
quero viver e morrer aqui não, visse?
- Tem uma saída.
- Tem uma saída? Qual é a saída?
- Você se casa comigo, fala com tio João e
diz que não quer ficar por aqui. Ele já tem negócio na capital. Ele dá um jeito
e...
- Que história é essa de casar, hein?
- É como eu disse: a saída.
- A saída?
- Isso! Casa e dá a saída. Vai embora daqui.
- Você quer que eu me case com você, é?
- Achando ruim? É muito melhor do que ficar
aqui, visse?
- Você é muito metido, sabe?
- Você vai querer, vai? Ah! Ah! Ah!
- Você é muito atrevido! Muito atrevido!
- É só uma saída. A gente vai ver o mar, o
rio de lá. Sabe que os rios de lá nunca ficam secos? Não acha bom?
- Vou contar isso pro meu pai. Que atrevimento!
- Diga. Diga a ele também que fui eu que falei
isso. Otaviano Neto
do Nunes, filho do “seu” Terêncio. Vá
dizer a ele. Vá dizer.
Para melhor entender, Otaviano Neto do
Nunes tinha sido criado pelo tio João Maria no meio da libertinagem.
Sua “avançada
educação” protagonizava as mais variadas sagas sexuais em todos os
meretrícios das cidades de Serra Talhada, Salgueiro, Flores, Carnaíba e
Triunfo.
Porém, Madalena não chegou a tomar mais a
fundo conhecimento desses fatos.
Otaviano, seguindo a “avançada educação” recebida do seu tio João Maria, protagonizava
variadas sagas sexuais em todos esses meretrícios sertanejos.
Mas seus amplos e variados conhecimentos
sobre o outro sexo não conseguiram subjugar a carne daquela garota educada nas
primazias da igreja de Roma.
Os desejos lúbricos de Otaviano só amainaram
após sua entrega como homem à escravidão dos olhos pequenos e piscantes da
herdeira dos genes de Castela e Aragão.
Como conquistador inveterado ele dera-se
conta: aquela mulher apenas seria domada através da liturgia do casamento.
Foi
ajudado nesse assunto pelo tio João Maria, que também morria de vontade de sair
daquelas plagas sertanejas e morar no Recife, local considerado por ele como muito
bom para seu estilo de vida e tino de comerciante.
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