Este é um espaço para divulgar contos e poemas de minha autoria já publicados em livros.
terça-feira, 28 de novembro de 2023
TEMPOS SOMBRIOS - Rafael Rocha
O SER DE OLINDA - Rafael Rocha
- do livro VIVER OLINDA E OUTROS DETALHES (2023) -
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Sou corpo de sal e de
água e de mar!
Sou corpo de terra e de
sé e luar!
Sou farol! Sou tribal!
Sou poeta!
Tudo porque nasci em
Olinda
e meu sangue é de
guerreiro caeté
com uma mistura
portugaholandáfrica
quase cem por cento genético assim.
Morei longo tempo em
Olinda
na velha casa de meu avô
paterno
em uma praça chamada
Padilha
que também era coronel
Cornélio
e nesse espaço conheci
uma lua diferente
e as escuras noites
cheias de estrelas
sob a luz em vaivém de um
farol.
Meu gosto de poetar vem
de Olinda
ainda que o Recife tenha
gerado versos
de terra e de paixões
concentradas
nos seus homens e nas
suas mulheres.
Vem de Olinda o hábito da
insônia
de quando a primeira
paixão nasceu
e de quando li os
primeiros clássicos.
Mesmo que o Recife traga
em si
o manejar da vida, em
Olinda conheci
o rio Tapado e as grandes
ressacas do mar.
A subida das íngremes
ladeiras,
o homem da meia-noite e a
mulher do dia,
e o medo do lobisomem nas
noites
das esplêndidas luas
cheias.
Fui jogador de futebol
nos descampados
de areia e capim perto do
rio Tapado
na praça do Padilha
que também era Cornélio
na frente da casa
duzentos e vinte e dois.
Com meus irmãos e
camaradas de infância
vi a menina Marilac jogando
futebol,
criando paixões sempre
que marcava um gol.
O Recife roubou de Olinda
a minha vida
e me levou ao Tejipió dos
avós maternos,
aumentando a força do
guerreiro caeté
e o banzo
portugaholandáfrica do homem.
Porque foi em Olinda que
nasceu
o gosto de amar/escrever
palavras
como essas que agora eu
escrevo
querendo voltar logo para
casa:
– A velha casa de meu avô na antiga praça
no velho bairro novo do
sonho!
Tudo porque nasci em Olinda
antes de o Recife
roubar de lá a minha vida!
ITINERÁRIO - Rafael Rocha
- do livro "Abismo das Máscaras" (2017) -
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O tempo não tem horário
é um itinerário onde apenas há passado
coisas gastas e antigas
como o espaço onde estamos a esperar:
o último
terminal.
O poeta aguarda ainda com esperanças
e vive entre homens e mulheres
dentro de uma abóbada vazia respeitando
o trâmite silencioso das coisas transmudadas em nada.
Ele é dono de
tantas esperas
está aqui como
criança nua
(tristemente
nua)
quase no fim
do itinerário
e quase a ser
passado.
A vida
ofereceu coisas para chorar
e outras
pequenas para alegrá-lo
mas todo poeta
tem dessas coisas
antes do
esvanecimento.
Sobram terra e
vegetais.
Sobram
recordações.