quinta-feira, 15 de agosto de 2024

SONHO - RAFAEL ROCHA

 

De onde vens, sonho viajeiro

Nessas noites depressivas

Voando dentro dos cérebros

Trazendo ações passivas?

De onde vens nessas tardes

Nas noites e dias reais

Trazendo saudade dos mortos

Lembrando os nossos iguais

Ainda vivos na terra

Na espera dos abraços?

Sonho que tira o sossego

Mexendo com meus espaços!

De onde vens, sonho de angústia

Provocando pressão alta

Pelas artérias humanas

Sem falar do amor que falta?

De onde vens, sonho viandante

Atormentar os momentos

Quando os corpos adormecem

Fugindo dos sentimentos?

 

Venho aéreo abrindo as asas

Por sobre todas as casas

Para exaltar o viver!

E trazer o desassossego

Aos que não têm apego

E que só pensam em morrer!

FICÇÃO (1973) - RAFAEL ROCHA

 

A vida não percorre

uma linha reta

ou uma linha curva

é apenas um sonho

tentando ser um horizonte

ve

rt

ic

al


INCITAÇÃO - RAFAEL ROCHA

 

O antigo sonho de paixão seja lembrado

antes de o barco de Caronte aportar no cais.

(Ainda não tenho a moeda da passagem!)

(Apenas recordações várias e sofríveis!)

Lembro como ofertei paixão à vida inteira

e criei penhor em corações rudes e frios

fundando vilas e cidades dentro das carnes.

 

Celebraram tudo isso como utopia!

Uma ilha fantástica sem realidades

quando eu acreditava no veraz da vida!

Pena que as casas sejam de pensamentos

mesmo sabendo caber no interior de todas

um mundo intenso e lúdico e infinito!

Pena que os alicerces sejam de ilusões!

 

Antes de o barco de Caronte

aportar no cais:

- Apareça, amor, apareça! -

Diga se eu tive ou não razão em sonhar!

 

Toda a loucura eu abriguei em devaneios

como se eles fossem cidadelas invictas

criadas por palavras e letras fantásticas

até que os ventos maléficos deram-se a uivar

tentando destruir meus gestos indomáveis.

(Tudo aquilo que me fez viver/sonhar!)

(Tudo aquilo que me levou a ser poeta!)

Ainda hoje esses ventos furiosos renascem

loucos, enraivecidos e prontos

para derrubar minhas frágeis casas.


Eles chegam com ares de psicopatas!

Sopram e derrubam as folhas do arvoredo!

Destroem tudo de humano e de paixão!

Até que do meu cantar sobra uma réstia

pelas ruas vazias das vilas e das cidades

onde eu tentava acreditar na incitação

de um poema e da metáfora desse poema.

 

Antes de o barco de Caronte aportar no cais

desejo caber inteiro na liquidez das palavras

como sendo um imenso lago ou oceano

ou o grandioso estuário de vários rios.

(Como sendo um H2O inimigo do Sol!)

Pecador sem arrependimentos!

Um homem simples na busca do sonho real

mais eternidade que esta curta vida!

 

Antes de o barco de Caronte

aportar no cais:

- Apareça, amor, apareça! -

Diga se eu tive ou não razão em sonhar!

UM DIA - RAFAEL ROCHA

 

Um dia abraçaremos

os heróis de nossas lutas!

Um dia recuperaremos

os ideais assassinados!

 

Sempre existe um dia!

 

Não estarei mais aqui.

Serei estrela exilada,

mas terei luz própria

nos rincões do cosmos.

 

Mesmo a luz do farol estando apagada:

– Um dia o grande barco retornará ao cais!

 

Sempre existe um dia!

 

Antes disso

quero sorver o que me resta de vida

ao lado dos meus amados

de todas as horas.