Do livro “Meio
a Meio” - 1979
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“Ontem, na tarde loura de aquarela
Alguém me perguntou – como vai ela?
Como vai o teu amor? – Eu respondi:
Não sei. Uma mulher passou na minha vida...
Não me lembro... E nessa hora comovida
Como nunca lembrava-me de ti”.
Menotti
Del Picchia
Ainda sobraram
uns pedaços da tua presença:
O cheiro do teu
corpo em algumas camisas.
O teu jeito
cotidiano de mostra-se má.
Coisas tuas que o
tempo não apaga
tais como um
gesto de carinho
um imenso desejo
do meu sexo
as veracidades da
tua natureza de mulher.
Restou o teu
retrato em três por quatro,
completamente
intato
na minha bolsa
capanga.
Um pouco do teu
jeito
espalhou-se nos
meus jeitos
coisas tuas que
emolduraram
meu desespero
desequilibrado.
De ti restou um
pouco
de nossa viagem
aos mercados
das coisas que
compramos juntos
tentando um mundo
novo
a nossa imensa
amizade,
as nossas rusgas
no jardim.
Ainda restou a
tua graça no meu pensamento.
Escrínios de teu
rosto bonito
nos rostos dos
camaradas.
Restaram vozes
tuas
quando cantavas
ao meu ouvido
canções que
falavam do amor na terra
e acima dela.
Depois de tudo
isso eu restei-me
com todos os teus
restos.
Com o teu modo de
me ouvir falar
de um futuro
ilusório.
De um canto só
nosso.
De algumas
crianças.
De relações
integrais
– teu corpo no
meu corpo –
E assim quem
restou fui eu mesmo,
eu inicialmente
que sabia as
lutas que travaste
com o mundo e com
tu mesma.
Que sabia de cor
as tuas vestes mais íntimas.
Que sabia o ponto
de partida
e chegada do teu
êxtase.
Restou, antiga
amada,
as cores das
nossas almas.
Nossos frêmitos, nossas fugas, nossas
dores.
Restou na realidade tua completa ausência.
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