quinta-feira, 10 de outubro de 2019

OLHOS ABERTOS PARA A MORTE – Rafael Rocha

Nono capítulo do livro homônimo lançado no ano de 2012 – Agraciado com Menção Honrosa pela Academia Pernambucana de Letras (APL) – Prêmio Vânia Souto Carvalho (2011)
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A noite estava fria.
Nos morros e campos do quartel do 14º Regimento de Infantaria, Fernando entrava em mais um dia de treinos.
Há alguns meses servia ao Exército.
O pai chefiava o grupo no qual ele e mais cinco rapazes estavam inscritos.
Todos tinham familiares nas Forças Armadas, mas aquele grupo se preparava para ingressar numa tropa especial que viajaria aos EUA dentro de alguns meses, com o objetivo de realizar outro tipo de treinamento.
Fernando Clemens, Glauco, Rômulo, Saraiva e Ximenes, respectivamente, soldados 41, 53, 58, 67 e 72, lutavam para ultrapassar a noite friorenta vestidos apenas de sunga.
Descalços, corriam pelos morros, observados pelo agora general Wellington Clemens, acompanhado nessa ocasião pelo capitão de Exército dos EUA, O’Higgins Leary, que seria dentro de alguns dias o comandante do grupo.
O norte-americano mostrava satisfação com o que via.
Em um português arrevesado disse ao general Clemens: “Eles são bons! O senhor soube treiná-los, general. E o seu filho é muito especial”.
O general mostrou satisfação com o elogio. “Desde pequeno ele vem sendo treinado para ser um exemplo de soldado, capitão”, exclamou.
“Em nossa base eles terão muito trabalho para fazer. Vão aprender também a matar inimigos. Matar sem piedade. Espero que estejam preparados para isso”, redargüiu o ianque.
“Garanto que eles estarão preparados capitão. Bastante preparados”, anuiu o general.
O fim da madrugada encontrou os cinco rapazes com os pés cortados e os corpos dilacerados pelos espinhos do mato. Ainda assim não mostravam resquícios de que estivessem sentindo dores.
Ninguém reclamava. O general Wellington Clemens deu por encerrado o exercício às 5 da matina.
Após tomarem banho e vestirem a farda os recrutas retornaram ao pátio, ficando postados como sentinelas sem mover um músculo durante uma hora, um ao lado do outro. 
Ao fim desse período foram liberados para descanso.

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