segunda-feira, 1 de julho de 2019

PRISÃO – Rafael Rocha



Do livro “Contos Delirantes com Versos em Bolero” - 2017

Quando os homens fardados de verde entraram no colégio, o medo tomou conta de todos os alunos adolescentes.
Afinal de contas, isso não acontecia todo dia.
Um truculento sargento dava ordens em voz alta e ríspida.
- Procurem em todas as salas. Façam um pente fino! - gritava.
- Eles estão procurando quem? - perguntou Osório ao colega Ítalo.
- Devem estar procurando o Aderaldo - respondeu Ítalo.
Os homens fardados iam de sala em sala.
Pegavam o livro de chamada e iam chamando os alunos um por um.
- Pela ordem alfabética o Aderaldo deve estar no topo da chamada - disse Osório.
- Estão entrando na sala dele agora - exclamou Ítalo.
- Mas o Aderaldo faltou à aula hoje – rebateu Osório.
Os homens fardados ficaram frustrados.
E o sargentão mais ainda.
- Ele não está aqui, sargento - disse o cabo.
- Que merda! A denúncia dizia que ele estaria aqui assistindo aula.
- Já demos pente fino duas vezes, sargento.
- Não podemos voltar de mãos vazias pro quartel, cabo. O capitão Clemens vai fuder com a gente.
Enraivecido por não encontrar Aderaldo, o sargento começou a andar de lá para cá no pátio de exercícios da escola.
Depois de uns minutos deu ordens para que a maioria dos militares retornasse para os caminhões estacionados na frente da escola e ficou no pátio com o cabo e mais quatro soldados.
- Aquele livro vermelho está na tua sacola, cabo?
- Qual livro?
- Porra! Aquele tal de manifesto comunista que o capitão disse que o tal Aderaldo estava lendo ontem na praça. A prova do crime, cabo!
- Ah, sim! Sim! Está comigo!
- Ótimo! Está vendo aquele cabeludinho lá no fim do pátio, sussurrando no ouvido daquele magricela?
- Sim, sargento. Estou vendo!
- Prenda ele! Pega esse manifesto e “planta” no meio dos livros do cabeludinho e lhe dê ordem de prisão. Lá no quartel o capitão resolve o que fazer.
Dito e feito, o cabo, acompanhado dos quatro soldados aproximou-se de Osório e deu voz de prisão.
- Eu? Eu? O que foi que eu fiz? O que foi que eu fiz? - ficou a gritar Osório, enquanto era manietado e levado quase arrastado até os caminhões. 
- Vida difícil essa de militar! - lamentou o sargento, dando um longo suspiro, aprumando o corpo e dirigindo-se para o jipe verde sem capota, que o esperava em frente ao prédio do colégio.


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