Do
livro “Contos Delirantes com Versos em Bolero” - 2017
Leonardo tinha um problema grave. Era paranoico e sofria de
Transtorno Obsessivo Compulsivo. Ele tinha muito cuidado com a própria sombra e
com os caminhos por onde andava e pisava.
Se as calçadas fossem lisas e sem riscos ele caminhava por sobre
elas normalmente. Se visse alguma fissura ou algo quebrado, tinha o cuidado de
não pisar nessa fissura ou risco, passando os pés cuidadosamente por cima até
alcançar o outro lado.
O maior cuidado era com a própria sombra. Por onde andasse, a
sombra tinha sempre de ficar atrás dele e jamais na frente. Achava que se desse
um passo com a sombra na frente poderia cair em um buraco negro.
Assim quando saía do trabalho, à noite, sempre estava armado com
uma lanterna a iluminar o caminho onde a sombra aparecesse.
O horário de meio-dia era o que ele mais gostava, porque não via a
sombra nem atrás nem à sua frente.
Isso tudo junto criava para Leonardo problemas variados.
As calçadas do Recife não eram de confiança, pois muitas delas
destacavam-se por terem fissuras e outros riscados.
Mas gostava de caminhar durante o dia pela Avenida Guararapes por
baixo daquelas marquises dos prédios afrancesados, já que a sombra não aparecia
de jeito algum para incomodar.
Leonardo viveu cerca de setenta e cinco anos.
Foi cliente de muitos psicólogos e psiquiatras do Recife,
município onde morava.
Mas não era louco. Tinha apenas uma paranoia generalizada com a
própria sombra e uma obsessão compulsiva com as fissuras das calçadas da
cidade.
Um dia Leonardo morreu.
Seu enterro ocorreu exatamente quando um eclipse total do sol escureceu
por completo o céu do Recife em pleno meio-dia.
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