Do livro
“Contos Delirantes com Versos em Bolero” – 2017
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Joel
abriu a gaveta da escrivaninha e dela retirou uma caixa escura. Após abrir a
caixa com uma chave de prata apareceram aos seus olhos uma pistola Derringer e
duas balas. Colocou tudo em cima da
escrivaninha e, fascinado, ficou a olhar o material.
Levantou
o corpo da cadeira em que estava e começou a caminhar pelo aposento, indo até a
janela, de onde olhou para a rua. O dia começava a nascer.
- É
questão de pouco tempo mesmo? Mas quanto tempo?
- Seis
meses. Se formos otimistas, talvez um ano, no máximo.
- Quer
dizer que nada mais adianta?
-
Gostaria de poder dizer a você que a ciência pode reverter o seu problema. Mas
nem isso...
- Tudo
bem. Entendi. Tenho de aceitar o fato.
-
Infelizmente, meu amigo. Infelizmente...
Retornou
à escrivaninha e segurou a pequena arma. Pegou as balas. Carregou a arma.
Colocou-a sobre a escrivaninha e ficou a olhá-la.
A
cabeça girava e múltiplos pensamentos tentavam se aglutinar em um só. Não
conseguia nem mesmo saber o que estava a pensar.
- Tudo
começou quando dei pra sonhar com elefantes brancos. Mas para que sonhar com
elefantes brancos, doutor?
- Um
fato incoerente. Confesso que é esquisito mesmo. Elefantes brancos não têm nada
a ver com um câncer incurável, meu amigo.
- E
eles resolviam caminhar pelo meu quarto e me levavam a perder o sono. Mas eu
estava dormindo mesmo e sonhando com eles. Meu terapeuta disse que eu
necessitava pensar no que tinha construído durante a vida. E mergulhar mais
fundo nas minhas digressões e nos meus comportamentos antigos. E no fim com
exames mais detalhados ganhei este câncer e esse seu diagnóstico mortal.
- Bom,
meu caro, eu já disse tudo que você precisava saber. Mas eu te garanto que
elefantes brancos não têm nada a ver com a doença. São simples alucinações
cerebrais.
Segurou
a pistola Derringer. Sopesou-a com a mão direita. Depois com a esquerda.
Apontou a arma para a parede defronte...
- Não
vou ficar sofrendo dores numa cama de hospital por causa dessa doença. Vou
tomar outra atitude.
- Posso
receitar algum remédio forte contra as dores, quando elas aparecerem.
- Não
será preciso. Já tenho o remédio certo.
-
Então, meu amigo. Terminamos a consulta. Você já sabe de tudo.
De
repente, a forte luz do sol entrou pela janela e o homem na cama acordou
assustado.
De sua
pele deslizavam grossas gotas de suor frio. Olhou para o outro lado da cama e
descobriu que a mulher já tinha acordado. Levantou-se, saiu da cama, rumou para
o banheiro. Tomou banho, escovou os dentes e de pijama encaminhou o corpo para
a cozinha.
-
Acordou tarde hoje, querido. Já são dez da manhã. Mas hoje é sábado. Não tem
trabalho.
- Tive
um sonho estranho.
- Vai
contar qual foi o sonho?
-
Sonhei com dois elefantes brancos, e depois um médico disse que eu estava com
câncer terminal e que só tinha seis meses ou um ano de vida. E comecei a
preparar o meu suicídio.
- Sonho
estranho! Mas sonho é ilusão! Esqueça e vamos tomar café! Deve ter sido efeito
da vodca que você bebeu ontem na festa. Isso acontece. Você tem é muita saúde.
E isso de elefantes brancos... Uau! Na verdade não é toda vez que alguém sonha
com elefantes brancos.
-
Realmente, meu bem. Realmente...
- Eu
sonhei com milhares de mariposas morrendo por causa de uma luz branca e
ofuscante. Não é um sonho esquisito também?
- Muito
esquisito! Muito!
- E
elas foram aos poucos morrendo nessa luz. Eu pedia a deus que ele não deixasse
as coitadinhas morrerem, mas essa luz ofuscante foi queimando elas aos poucos.
- E
então todas elas sumiram, não foi?
-
Exatamente. Elas sumiram. Mas como você descobriu? Eu não contei essa parte.
- Foi exatamente isso que os elefantes brancos falaram para mim no meu
sonho. Disseram que iriam matar todas as mariposas com suas luzes ofuscantes.
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